As eleições e a LGPD

A principal dúvida sobre a LGPD nas próximas eleições é a coleta de dados para o envio de material de propaganda eleitoral. Como fazer isso legalmente?

Por Paulo Golambiuk e Maitê Marrez

O tema ainda é pouco debatido, justamente por ser incipiente no contexto eleitoral. Pela primeira vez, a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral que trata da propaganda (n.º 23.610/19, alterada pela Resolução n.º 23.671/21), dispõe que o tratamento de dados “deverá respeitar a finalidade para a qual o dado foi coletado, observados os demais princípios e normas previstas na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)” (art. 10, §4º).

O assunto passou a ser tão relevante que o próprio TSE elaborou e divulgou um Guia Orientativo: aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) por agentes de tratamento no contexto eleitoral.

As regras que predominam são a transparência (o eleitor deve ter ciência da coleta de seus dados e da finalidade à qual se presta) e a anuência expressa. Um exemplo corriqueiro, já visto durante a pré-campanha de 2022, é o envio de mensagens contendo apresentação do pré-candidato e sugestão de acompanhamento das propostas e projetos desde logo, contendo expressamente a opção de não mais receber mensagens daquele tipo, caso o destinatário assim escolha.

Essa opção, aliás, evita a violação ao art. 34, II da Resolução n.º 23.610/19, justamente porque há o consentimento e a opção de descadastramento. Importante destacar que, de acordo com o TSE no Guia Orientativo, o consentimento se perfectibiliza “quando todas as informações necessárias para uma avaliação consciente pela pessoa titular forem apresentadas pelo(a) agente de tratamento”. Entre essas informações se encontra o “conhecimento prévio a respeito da forma e do prazo pelo qual seu dado pessoal será tratado, bem como das finalidades pretendidas pelo controlador”.

Mas esse é um momento posterior. Há outra dúvida prática existente entre os pré-candidatos: como construir, legalmente, uma base de dados para o envio de mensagens voltadas à pré-campanha e, posteriormente, para a campanha.

Um exemplo de como tal construção poderia ser realizada é a disponibilização, no site da agremiação, coligação, federação ou do pré-candidato(a) ou candidato(a), de formulário a ser preenchido pelo usuário para o recebimento de material de campanha, desde que preenchidos os requisitos de transparência (consentimento, opção de descadastramento, finalidade e período da coleta de dados).

O referido formulário deve indicar expressamente que se destina ao envio de material de propaganda eleitoral. Caso a finalidade tenha sido outra (como, por exemplo, registro de participação em evento do partido), os dados não podem ser utilizados para o envio de propaganda, sendo necessário elaborar outro formulário para tanto. Em outras palavras, não é possível o desvirtuamento da coleta de dados em relação ao objetivo inicial.

Ressalte-se que os players do processo eleitoral não podem utilizar banco de dados oriundos de pessoas jurídicas de direito privado, entidade ou governo estrangeiro, órgão da administração pública direta e indireta ou fundação mantida com recursos provenientes do Poder Público, concessionário ou permissionário de serviço público, entidade de direito privado que receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de disposição legal, entidade de utilidade pública, de classe ou sindical, pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior, entidades beneficentes e religiosas, entidades esportivas (que recebam recursos públicos ou não) e ONGs (art. 34 da Resolução n.º 23.610/19).

Outra recomendação do TSE é a criação de um canal de comunicação para receber as demandas da pessoa titular de dados e para discutir questões relacionadas ao tratamento de dados, como um
e-mail próprio. Também é recomendável a adoção de medidas de segurança para evitar o vazamento de dados, como “controle de acesso à informação; coleta, compartilhamento, armazenamento e descarte de dados pessoais; uso de correio eletrônico e de outras plataformas de comunicação” e controle do uso de senha.

O ambiente digital possui cada vez mais relevância nas campanhas eleitorais. Justamente por tal motivo, o cuidado para evitar excessos é redobrado e o Tribunal Superior Eleitoral já indicou, tanto em julgamentos midiáticos quanto através das Resoluções, que não irá tolerar abusos.

Mesmo assim, observadas as formalidades legais, é possível utilizar a Internet para, estrategicamente, impulsionar as candidaturas e alcançar maior número de eleitores.

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